Açúcar dispara com atraso na colheita e baixas na Índia

Prof. Dr. Marcos Fava Neves

Vinicius Cambaúva

Vitor Nardini Marques

Reflexões dos fatos e números da cana em abril e o que acompanhar em maio.

Na cana, com o término da safra 2022/23 na região Centro-Sul, no final de março, a moagem da matéria-prima fechou o ciclo em 548,3 milhões de t, 4,6% a mais do que 2021/22 (524,10 milhões de t), segundo a União da Indústria de Cana-de-açúcar e Bioenergia (Unica) e também acima das expectativas para o ano.

A produtividade agrícola ficou em 73,3 t por hectare na média, 8,1% maior, justificada pelas condições climáticas mais favoráveis nos meses do verão de 2022, quando comparado ao ciclo anterior; informação que foi compilada pelo Centro de Tecnologia Canavieira (CTC). Já a o teor de ATR (Açúcar Total Recuperável) na cana fechou 2022/23 em queda de 1,5%, atingindo 140,80 kg por t da matéria-prima.

Na segunda quinzena de março, 39 usinas deram início a safra 2023/24, o que totalizou 63 unidades em operação neste período, sendo 52 de cana-de-açúcar e outras 11 de etanol de milho. Vale destacar que começamos o novo ciclo com bom ritmo industrial, bem à frente do último ano; em 2022/23, estávamos com 25 usinas em operação neste mesmo período.

De acordo com o decreto 11.141/2022, houve a postergação da data de cumprimento para a meta de 2022 (35,98 milhões de CBios), de 31 de dezembro de 2022 para 30 de setembro de 2023. Segundo a B3 (Bolsa de Valores Brasileira), 25,48 milhões de CBios já foram aposentados pela parte obrigada no programa; e os outros 10,50 milhões de CBios deverão ser aposentados até o final de setembro. Até 31 de março, 8,04 milhões de CBios foram emitidos em 2023.

Para a safra recém iniciada, 2023/24, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) previu uma moagem de 637,1 milhões de t no Brasil, aumento de 4,4% em relação ao ciclo passado (610,0 milhões de t). Na região Centro-Sul, a expectativa é de 577,3 milhões de t (+ 4,9%).

No açúcar, a produção total do adoçante em 2022/23 ficou em 33,7 milhões de t, alta de 5,2% no comparativo com 2021/22, quando 32,1 milhões de t foram produzidas.

No mercado internacional, os embarques de açúcar brasileiro voltaram a crescer em março, após a retração de fevereiro, o que comentamos aqui. Foram 1,83 mi de t embarcadas, alta de 27,0%. Já as receitas somaram US$ 819,42 milhões, crescimento ainda maior, de 46,0%. Os resultados se justificam pelas altas no preço médio da t embarcada do adoçante, que fechou março em US$ 448,40, 15,2% superior ao mesmo mês de 2022.

Consequência do baixo índice pluviométrico ao longo da safra de cana-de-açúcar, a Associação Indiana das Usinas de Açúcar (ISMA) reviu as estimativas para a produção do adoçante no ciclo atual, para 32,8 milhões de t, queda de 3,5% em relação a previsão anterior que era de 34 milhões de t. Vale lembrar que em 2021/22, o país asiático produziu 35,8 milhões de t; ou seja, uma baixa de 3 milhões de t neste ano agrícola. A notícia tem jogado para cima os preços do açúcar no mercado internacional.

Vale lembrar, ainda, que o governo restringiu as exportações de açúcar na Índia para 6,1 milhões de t em 2022/23, ainda que haja expectativa da permissão para uma segunda parcela de vendas. No ciclo passado, o país exportou 11,2 milhões de t, recorde até então.

A revisão também foi feita para a produção na Tailândia: esperava-se 12,0 milhões de t e foram produzidos 11,0 milhões de t, segundo representantes locais.

Na data de fechamento da nossa coluna, os contratos para julho em Nova York estavam em um dos maiores níveis desde março de 2012: 25,32 centavos de dólar por libra-peso. Já o contrato de maio era negociado em 25,91 centavos de dólar por libra-peso. Assim, os preços em reais (considerando o câmbio e o prêmio de polarização; 4,2%) ficaram em R$ 3.020 por tonelada. Já o açúcar cristal branco (Cepea/Esalq) saiu de R$ 133,64/sc (60kg) há 30 dias para atuais R$ 143,02/sc (+7,0%).

A alta de quase 25% nos preços internacionais do açúcar é justificada pelo atraso na colheita brasileira de cana-de-açúcar, prejudicando o fluxo global.

No etanol, a produção fechou 2022/23 em 28,91 bilhões de litros, alta de 4,7%. Desse total, 16,62 bilhões de litros (57,5%) foram do etanol hidratado (- 0,6%) e 12,29 bilhões de litros (42,5%) do anidro (+12,7%). Além da alta na oferta do anidro, em virtude da aceleração no consumo interno da gasolina, destaca-se também o crescimento na produção do biocombustível advindo do milho: foram 4,43 bilhões de litros, 27,9% superior e respondendo por 15,3% de toda a produção nacional de etanol. 

Foram comercializados internamente 15,46 bilhões de litros do hidratado (- 1,4%) e 11,03 bilhões de litros do anidro (+ 7,4%) em 2022/23.  Já para o mercado internacional (exportações) vendemos 1,13 bilhão de litros do hidratado (+ 11,1%) e 1,48 bilhão de litros do anidro (+139,51%). Assim, ao todo, foram transacionados 29,09 bilhões de litros no ciclo recém finalizado.

No último mês de março, foram comercializados 244,43 milhões de litros de etanol pelo Brasil, sendo: 191,17 milhões de litros do hidratado (+ 37,2%) e 53,26 milhões de litros do anidro (-22,43%). 

Em âmbito internacional, importante acompanharmos também os preços do petróleo. Nos últimos dias, as principais referências globais têm registrado queda: o Brent saiu de ~US$ 83/barril em 19/04 para US$ ~78/barril em 26/04; e o WTI Crude foi de ~US$ 79/barril a ~US$ 74/barril nas mesmas datas.

Em relação aos preços do etanol, em 26 de abril, o hidratado para Ribeirão Preto (SP) estava em R$ 3,320/l; e o anidro em R$ 3,420/l com impostos, de acordo com relatório da SCA Etanol do Brasil. Em Goiás, os preços eram de R$ 3,340/l e R$ 3,400/l, respectivamente, para o hidratado e anidro. Já o indicador do etanol hidratado em São Paulo (Cepea/Esalq) estava em R$ 3,0917/l em 20 de abril, 15,2% superior aos R$ 2,6827/l de 24 de março. 

O retorno dos impostos federais sobre a gasolina, desde março, tem contribuído para alta nos preços do combustível, em torno de R$ 0,47/l, enquanto o etanol teve alta de apenas R$ 0,02/l, de acordo com a Stonex. Esse contexto contribuiu para redução na paridade de 74,3% (fevereiro) para 71,2% (março).

Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em maio na cadeia da cana:

  1. Continuar acompanhando o ritmo de retomada das operações de moagem pelas usinas da região Centro-Sul. Os dados relativos ao mês de abril devem sair nos próximos dias, indicando que algo próximo da totalidade já deve estar operando normalmente na região.
  2. O clima no próximo mês, considerando possíveis impactos na fisiologia da planta (estímulo ao crescimento vegetativo e menor concentração de açúcares), além dos efeitos nas operações de colheita. As condições foram bastante positivas para o setor até o momento, mas vale acompanharmos se teremos alterações que prejudiquem as lavouras.
  3. Negociações e o mercado global do açúcar. Com as novas incertezas envolvendo a oferta do produto pela Índia e a expectativa de crescimento na demanda global, a tendência é que os preços se mantenham elevados. No Brasil, as usinas já fixaram a maior parte dos volumes a serem exportados no novo ciclo… será que virão outros movimentos que estimulem o mix para o adoçante? 
  4. Acompanhar também o mercado de grãos, especialmente de soja e milho. Vale lembrar que o etanol advindo do cereal já responde por 15% da produção nacional. Nas últimas semanas, os preços do milho caíram para os menores níveis em mais de 2 anos, cenário favorável as indústrias do biocombustível. A tendência é que o preço siga em patamares mais baixos agora.
  5. As discussões internas envolvendo o arcabouço fiscal, com foco em analisar possíveis impactos que as medidas trarão ao setor e atividade produtiva. Soma-se aqui a situação econômica do Brasil e do mundo, o que tem trazido movimentos na cotação do dólar.

Valor do ATR: a safra 2022/23 encerrou com o acumulado em R$ 1,1707/kg, a nossa aposta aqui na coluna durante boa parte do ciclo. Relembrando o histórico: começamos a safra com R$ 1,2453/kg em abril; fomos a R$ 1,2037/kg em julho; caímos para R$ 1,1079/kg em outubro; voltamos a R$ 1,1682/kg em fevereiro; e março fechamos com R$ 1,2019/kg, o que possibilitou o reajuste para cima no valor final. Para 2023/24, nossa expectativa inicial é de que os preços se mantenham neste nível. Vamos torcer!

Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio. Acompanhe outros materiais na página DoutorAgro.com e no canal do Youtube.

Análises e conjunturas

Comments are disabled.

_

Receba nossas atualizações




    %d blogueiros gostam disto: