Preços do Açúcar Reagem no Mercado Internacional
Reflexões dos fatos e números da cana em julho e o que acompanhar em agosto
Prof. Dr. Marcos Fava Neves, Vinicius Cambaúva e Beatriz Papa Casagrande
Na cana, a moagem de cana-de-açúcar da região Centro-Sul alcançou 209,79 milhões de t desde o início do ciclo até o início de julho deste ano, refletindo um avanço de 11,51% em comparação à safra 2022/23, segundo apurado pela Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar e Bioenergia). Estamos com 257 unidades em operação, sendo que 242 utilizam a cana como matéria-prima, enquanto as outras 7 fabricam etanol a partir do milho e 8 são flex.
Por outro lado, o rendimento da cana na segunda quinzena de junho foi ligeiramente menor ao evidenciado no mesmo período do ciclo passado, sendo 133,04 kg/t, contra 137,19 kg/t (-3,02%) no mesmo período de 2022. A redução da qualidade, em decorrência de um clima mais seco, pode ser explicada pela colheita antecipada de áreas em que a planta ainda não atingiu plena maturação. A estratégia de avançar nessas áreas busca aproveitar as condições favoráveis para a colheita durante os meses mais frios, antecipando a possível escassez nos últimos meses do ciclo atual. Porém, no acumulado da safra, o indicador marca um valor de 128,29 kg de ATR por t (+0,74%).
Para o mix de produção acumulado da safra, observamos um favorecimento da cana destinada à produção de açúcar, estando em 47,68% (42,56% em 2022), enquanto o etanol está em 52,32% (era 57,44%). Enquanto isso, na última quinzena de junho o mix foi de 49,43% para açúcar e 50,57% para o etanol. A alocação de quase 50% do ATR para o adoçante estabelece o limite máximo viável de extração de sacarose do caldo, o que coloca a quinzena em uma posição pouco vista antes.
Já com relação ao mercado de CBios, dados da B3 (Bolsa de Valores Brasileira) até o dia 7 de julho sinalizam a emissão de 16,61 milhões de títulos em 2023. Em torno de 51,38 milhões de créditos de carbono foram adquiridos pela parte obrigada do programa RenovaBio, considerando o estoque de passagem em 2021 somados com os créditos adquiridos em 2022 e 2023.
No açúcar, a produção de açúcar acumulada no ciclo foi 28,85% superior, atingindo 12,23 milhões de t (contra 9,72 milhões), segundo dados da Unica. Considerando apenas o intervalo dos últimos quinze dias de junho, o volume produzido de adoçante totalizou 2,69 milhões t, enquanto em 2022 o valor era de 2,51 milhões t (+7,57%).
Segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), em junho, 2,87 milhões de t de açúcar foram exportadas pelas usinas brasileiras, alta de 23,1% no comparativo com o mesmo mês de 2022. Com preço médio no mês em US$ 486,00/t (+ 22,9%), as receitas totais somaram US$ 1,40 bilhão, sendo 51,3% superior ao mesmo mês de 2022. No acumulado deste ano, o Brasil já vendeu US$ 5,28 bilhões (+ 39,4%) e embarcou 11,24 milhões de t (+ 15,7%).
E na data da conclusão do texto mensal, os preços do açúcar no mercado internacional registraram nova alta com: a recuperação da economia chinesa; as preocupações com o clima (El Niño podendo trazer secas intensas na Índia e Tailândia e chances de aumentar as chuvas no Centro-Sul do Brasil); a inflação nos EUA que vieram abaixo da expectativa para junho; e a possível mudança nos preços do petróleo em 2024, com previsão recente de aumento na demanda global.
Em Nova York, o contrato de outubro/2023 estava cotado em R$ 24,32 centavos de dólar por libra-peso; o de março/2024 em R$ 24,46 cts/lb; e os de julho/2025 a R$ 19,24 cts/lb. Em Londres, os preços da tonelada embarcada para agosto/2023 fecharam em US$ 700,70; já a tela de outubro/2023 estava em US$ 685,70/t. Por outro lado, no mercado doméstico, o açúcar cristal (Indicador Cepea/Esalq) fechou em R$ 136,31/sc (50 kg), uma queda acumulada mensal de 2,56%.
No etanol, a oferta de etanol no acumulado da safra (até 1º de julho, segundo a UNICA) foi de 9,6 bilhões de litros, um incremento de 6,17% em comparação ao mesmo período de 2022. Desse volume, 5,49 bilhões se referem ao hidratado (-5,69%) e 4,11 bilhões correspondem ao anidro (+27,63%). Cerca de 1,36 bilhão de litros foi obtido a partir do milho desde o início do ciclo 2023/24, uma alta anual de 41,19% para este segmento
Em relação a comercialização do biocombustível, foram vendidos 7,02 bilhões de litros, o que configura uma pequena retração de -0,4% frente a 2022/23. Desse total, 94,62% foram comercializados no mercado doméstico (6,64 bilhões), enquanto 5,38% tiveram como destino embarques ao exterior (38 mil).
E na última semana de junho, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) anunciou uma rodada de prêmios visando aumentar o consumo de biocombustíveis no país, com destaque para o etanol e biodiesel. Ao todo, o governo irá disponibilizar US$ 25 milhões (ou R$ 120 milhões) para investimentos em projetos de infraestrutura permanente no setor, como tanques de armazenamento, bombas, tubulações e outros. Serão beneficiados 59 projetos em 14 estados, o que deve ampliar o acesso dos consumidores em até 590 milhões de litros de biocombustíveis (estimativa USDA). Em suma, o governo investirá cerca de 65 centavos de dólar por litro.
Ainda sobre os Estados Unidos, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) ampliou o volume previsto para mistura de biocombustíveis em combustíveis convencionais até 2025. Para tanto, o governo estabeleceu os volumes em 20,94 bilhões de galões em 2023, 21,54 bilhões de galões em 2024 e 22,33 bilhões de galões em 2025. Apesar da alta, agentes do setor criticaram a medida, já que os volumes estabelecem uma regra de consumo de apenas 15 bilhões de litros de biocombustíveis convencionais, como o etanol de milho, nos três anos; a proposta inicial era de 15 bilhões de litros em 2023 e 15,25 bilhões de litros em 2024 e 2025. Segundo a EPA, a medida deve reduzira demanda de petróleo em 130 a 140 mil barris por dia até 2025.
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) ampliou em 2 milhões de barris diários a demanda (consumo) global do combustível fóssil para 2024, no comparativo com a estimativa do mês passado: ao todo serão 104,3 milhões de barris por dia no próximo ano. Este valor corresponde a uma taxa de crescimento quase que duas vezes maior do que a projetada pela Agência Internacional de Energia. Após a divulgação, os mercados reagiram e os preços do barril cresceram significativamente: o WTI Crude estava em US$ 71,93/barril em 19/06, foi a US$ 76,89/barril em 13/07 e estava em US$ 74,16 em 17/07 (data de fechamento da nossa coluna); já o Brent variou de US$ 76,06/barril para US$ 81,36/barril entre 19/06 e 13/07 e ficou em US$ 78,55/barril em 17/07. Vale destacar que o Brent não ultrapassava a marca de US$ 80/barril desde 28 de abril.
Olhando para o futuro, um estudo divulgado pela International Energy Agency (IEA) prevê que a demanda global de petróleo deve crescer 6% entre 2022 e 2028, atingindo 105,7 milhões de barris diários e, após esse período, deve se estagnar. Segundo a agência, o crescimento anual da demanda deve cair de 2,4 milhões para 400 mil barris por dia até 2028. Entre os fatores que indicam a estagnação, o IEA aponta a alta dos preços da commodity e as preocupações com o abastecimento global, o que deve acelerar a mudança da matriz energética global.
No Brasil, no último dia 30 de junho, a Petrobras anunciou uma nova redução no preço da gasolina para as distribuidoras: de R$ 2,65/l para R$ 2,52/l, 5,3% menor ou R$ 0,14/l a menos. Também ao final de junho, o governo federal elevou os tributos federais sobre gasolina e etanol: de R$ 0,34/l para a gasolina e de R$ 0,22/l no etanol. Vale lembrar, ainda, que no início de junho passou a valer a alteração na forma de cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) da gasolina nos estados, o que fixou e unificou uma alíquota de R$ 1,22 por litro. Após as alterações, os preços da gasolina subiram de R$ 5,21/l para R$ 5,63/l até o dia 14 de julho, segundo a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
E concluindo nossa análise do etanol, o preço da SCA Etanol do Brasil apontam que em 14 de julho o Hidratado ficou em R$ 2,580/l e o anidro em R$ 2,77/l ambos para Ribeirão Preto, com impostos.
Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em agosto na cadeia da cana:
- Progresso da colheita de cana na região Centro-Sul, que segue em ritmo acelerado na comparação com o ciclo passado, bem como as previsões mais recentes para a produção total; alguns grupos e usinas do setor já reveem suas estimativas de moagem para cima. Vale lembrar que a maior oferta de matéria-prima deve ampliar também a oferta dos produtos do setor, possivelmente afetando os preços.
- Acompanhar as atualizações em relação ao El Niño e o clima. As previsões mais recentes apontam grande chance de secas intensas na Índia e Tailândia, o que já tem alterado as previsões da safra nestes países. No Brasil, é essencial seguir de olho nas chances de chuvas na região Centro-Sul. Ao que parece, até o momento, não tivemos impactos; vamos seguir observando.
- Negociações envolvendo o açúcar no mercado internacional. Os preços seguem se sustentando em níveis elevados (em torno de 24 cts/lb) com a melhora no desempenho das economias da China e Estados Unidos, bem como pelas chances de perdas na produção asiática em função do clima, como citado no item anterior.
- Reações do mercado internacional após as novas previsões de aumento na demanda do petróleo em 2024. Os preços do Brent voltaram a superar os US$ 80/barril em 13 de julho. Vamos acompanhar como estes se comportam a partir de agora e capturar possíveis impactos no setor sucroenergético.
- Por fim, seguir acompanhando a demanda e/ou opção de consumo de combustíveis no Brasil, bem como os preços do etanol e gasolina com as mudanças recentes na tributação (ICMS), a nova baixa de preços da gasolina pela Petrobras e a volta dos tributos no etanol e na gasolina. Pela característica do governo atual, novas movimentações podem ser feitas e é essencial estar preparados para estas mudanças.
Valor do ATR: o preço do Açucar Total Recuperável (ATR) fechou junho com média de R$ 1,2223/kg, alta de 2,3% na comparação com maio; ou 0,28 centavo a mais. Recordando o histórico do ciclo 2023/24: abril, iniciamos com R$ 1,2129/kg; em maio caiu para R$ 1,1943/kg; e agora em junho com R$ 1,2223/kg. Com o resultado do último mês, o acumulado está em R$ 1,2126/kg. Seguimos com nossa opinião de que o ATR deve encerrar 2023/24 entre R$ 1,20 e 1,23kg. Vamos seguir avaliando.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) da FGV (São Paulo – SP) e da Harven Agribusiness Scholl (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em DoutorAgro.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves).
Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group, mestrando em Administração pela FEA-RP/USP e Instrutor “In Company” na Harven Agribusiness School. É especialista em comunicação estratégica no agro.
Beatriz Papa Casagrande é consultora na Markestrat Group, aluna de mestrado em Administração de Organizações na FEA-RP/USP e especialista em inteligência de mercado para o agronegócio.